10/12/2012
O povo judeu e sua fé
Dando
continuidade ao projeto As Religiões e a História,
o Historiante traz para os leitores, neste mês de
dezembro, um texto sobre o judaísmo. Das mais antigas
crenças da humanidade ainda em prática na
contemporaneidade, a cultura religiosa dos povos hebreus
sobreviveu a guerras, tentativas de extermínio em massa
de seus adeptos, preconceitos e diásporas. A fé num
único deus, Javé/Jeová, e a promessa de um messias que
os libertará da opressão são alguns dos pilares que
sustentam sua crença.
Boa leitura
e ótimos estudos.
A FAMÍLIA DE ABRAÃO
Diz o Velho Testamento que Abraão recebeu
de Deus, por volta dos 75 anos de idade, o chamado para
se mudar de mala e cuia para os rincões de Canaã, com a
promessa de que seus descendentes dariam origem ali a
uma grande nação. Dez anos depois, porém, já
estabelecido na nova terra, o longevo migrante ainda não
havia conseguido gerar a tão esperada prole. Sara, a
esposa, o instigou a desposar sua serva, a egípcia Agar,
para fazer valer o desígnio divino – união que produziu
o menino Ismael. Quando o rapagote completava seu 13º
aniversário, Abraão, já com 99 anos, teve outro encontro
com Deus, que reiterou a promessa feita anteriormente e
garantiu que a posteridade de Abraão sairia das
entranhas de Sara. Dito e feito: no ano seguinte veio ao
mundo Isaac, filho do centenário porém fecundo
patriarca.
Abraão contemplando o céu
Na festa de apresentação de Isaac,
contudo, Sara viu o primogênito zombando do caçula, e
ordenou ao marido que expulsasse Agar e Ismael de seus
domínios. A idéia de desterrar o sangue do seu sangue
não agradou a Abraão, que apenas levou a cabo a ação por
ter a garantia de Deus que seu filho com a escrava
também teria um destino fabuloso, iniciando outra grande
nação. Assim, fornecendo um pão e um odre de água a Agar
e Ismael, o patriarca mostrou-lhes o caminho da rua logo
na manhã seguinte. Ambos erraram por algum tempo pelo
deserto da Bersabéia, até que Ismael se fixou no deserto
da Arábia, produzindo doze filhos – as doze tribos
ismaelitas, ancestrais do povo árabe. Do outro lado da
família, em Canaã, seu irmão Isaac teve como prole Esaú
e Jacó. Os doze herdeiros deste último (rebatizado mais
tarde de Israel) compuseram as doze tribos que deram
origem ao povo hebreu.
O JUDAÍSMO APÓS ABRAÃO
Isaque, filho de Abraão, tem um filho chamado Jacó. Este
luta, num certo dia, com um anjo de Deus e tem seu nome
mudado para Israel. Os doze filhos de Jacó dão origem às
doze tribos que formavam o povo judeu. Por volta de 1700
AC, o povo judeu migra para o Egito, porém são
escravizados pelos faraós por aproximadamente 400 anos.
A libertação do povo judeu ocorre por volta de 1300 AC.
A fuga do
Egito
foi comandada por Moisés, que recebe as tábuas dos Dez
Mandamentos no monte Sinai. Durante 40 anos ficam
peregrinando pelo
deserto,
até receber um sinal de Deus para voltarem para a terra
prometida, Canaã.
Jerusalém
é transformada num centro religioso pelo rei Davi. Após
o reinado de Salomão, filho de Davi, as tribos
dividem-se em dois reinos: Reino de Israel e Reino de
Judá. Neste momento de separação, aparece a crença da
vinda de um messias que iria juntar o povo de Israel e
restaurar o poder de Deus sobre o mundo.
Em 721
começa a primeira diáspora judaica com a invasão
babilônica. O imperador da
Babilônia,
após invadir o reino de Israel, destrói o templo de
Jerusalém e deporta grande parte da população judaica.
No século I, os
romanos invadem a Palestina e destroem o templo de
Jerusalém. No século seguinte, destroem a cidade de
Jerusalém, provocando a segunda diáspora judaica. Após
estes episódios, os judeus espalham-se pelo mundo,
mantendo a cultura e a religião. Em 1948, o povo judeu
retoma o caráter de unidade após a criação do estado de
Israel.
A Torá, de acordo com a
tradição judaica, é o livro sagrado que foi revelado
diretamente por Deus. Fazem parte da Torá: Gênesis, o
Êxodo, o Levítico, os Números e o Deuteronômio. Esses
também são os primeiros livros da Bíblia Cristã. O
Talmude é o livro que reúne muitas histórias contadas de
pai para filho e é dividido em quatro livros: Mishnah,
Targumin, Midrashim e Comentários.
OS
ENSINAMENTOS JUDAICOS EM TERRAS BRASILEIRAS
Quem nunca ouviu dizer que não se deve deixar sapato
virado ao contrário, roupa pelo avesso, portas de
armário abertas, varrer o lixo pela porta da frente de
casa, dizer que alguém está “chorando a morte da
bezerra” ou apontar a primeira estrela no céu? Estas e
outras práticas do cotidiano de tantas famílias de Norte
a Sul do país encontram, muitas vezes, associação no
judaísmo que era praticado no Brasil. No caso da limpeza
das residências, por exemplo, é costume entre os judeus
manter sobre o batente da porta da entrada um mezuzá
– pequeno pergaminho contendo trechos da Torá, livro
sagrado dos judeus. Por isso, varre-se a casa, por
respeito e honra, da porta pra dentro, onde o lixo é
então recolhido, para que não passe pela
mezuzá.
Mezuzá
Após a segunda diáspora
em 135 d.c, as comunidades judaicas se espalharam por
todo o mundo. Países como a Alemanha, Polônia, Ucrânia e
Rússia receberam grandes números de imigrantes Judeus.
Em 1503, o
cristão-novo (judeu convertido) Fernando de Noronha
enviou barcos para extrair pau-brasil da terra
descoberta por Cabral. Nas décadas seguintes, a colônia
serviu de refúgio para milhares de cristãos-novos,
perseguidos na metrópole por praticar um catolicismo
duvidoso. Esses imigrantes contribuíram com seus genes e
sua cultura para a formação do povo brasileiro.
Em fins do século XVI,
os cristãos-novos já eram donos de boa parcela dos
engenhos existentes no Nordeste e ameaçavam os
interesses dos cristãos-velhos, incomodados com a
concorrência. Esses cristãos-novos não se limitavam ao
açúcar: integrados na Colônia, eram influenciados e
influenciavam a vida e os costumes locais. Eles exerciam
funções na política, na administração e na economia,
participando, ao lado dos cristãos-velhos, de várias
atividades. Prova desse bom convívio eram os casamentos
entre as famílias. A falta de moças cristãs para casar
tornava as meninas judias muito disputadas. Esses
casamentos serviam para que os antigos judeus pudessem
provar que estavam convertidos ao cristianismo,
despistando as desconfianças das autoridades da época.
A primeira sinagoga do
Novo Mundo foi edificada no Recife pelo rabino Isaac
Aboab da Fonseca, durante o domínio holandês no
Nordeste.
Sinagoga em Recife/PE
Com a criação do Santo
Ofício no Brasil, esse quadro de harmonia acabou. Vários
cristãos-novos eram acusados de continuar as práticas
judaicas, e muitos foram enviados para Lisboa, para
julgamento e prisão ou morte na fogueira.
As acusações
apresentavam uma grande variedade de comportamentos
vistos como denunciadores da ocorrência do judaísmo
vivendo na Colônia, como usar roupas limpas e arrumas a
casa às sextas-feiras em respeito ao Shabat, não
pronunciar o nome “Cristo”, preparar a comida segundo a
tradição hebraica, não ingerindo carne de porco ou
peixes sem escamas, entre outras práticas.
Com tanta perseguição,
as casas das famílias judaicas transformaram-se em
únicos lugares para a prática dessa religião, onde as
mulheres exerciam o papel de mães, professoras e
rabis, contando para os filhos as histórias dos
povos judeus e ensinando as antigas orações judaicas.
A COMUNIDADE DO ARRECIFE
No dia 5 de
fevereiro de 1638, Manuel Mendes de Castro, cristão-novo
natural de Portugal, também chamado de Manuel Nehemias,
chega ao Recife desejando criar uma colônia agrícola com
200 judeus, “entre os ricos e pobres”, no Nordeste do
Brasil. Seus planos não deram certo, conforme cartas do
conde Maurício de Nassau: “em vez de se encaminharem
para o seu destino, aqui se dispersaram e cada um tomou
seu caminho tendo falecido o chefe”.
Em 1635, com
o domínio dos holandeses na região nordestina, muitos
judeus atravessaram o oceano Atlântico e vieram viver em
Pernambuco, onde a comunidade do Recife mantinha a
primeira sinagoga das Américas e era conhecida em
diversos lugares do mundo. Antes disso, muitos judeus já
tinham vindo morar no Brasil.
Em terras
nordestinas, uma colônia judaica começou a se formar com
a chegada dos holandeses. Em 1624 eles invadiram a
capital da Bahia, foram expulsos pelos portugueses com a
ajuda da Espanha. Seis anos depois, invadiram a região
pernambucana, querendo conquistar a produção de açúcar
do lugar. Desse período até 1654, quase todo o nordeste
brasileiro ficou conhecido como o “Brasil Holandês”.
Durante esse
período, a tolerância e o respeito religioso ficaram
garantidos na região holandesa do país, conforme a lei
da época, de 13 de outubro de 1629. Por isso, Pernambuco
passou a ser o melhor lugar para os judeus viverem. No
Recife, o grupo judaico crescia a cada dia, e a cidade
já não tinha espaço para tantos imigrantes judeus. A
solução veio com a compra de vários terrenos no caminho
de Olinda.
Um pedaço
desses terrenos ficou conhecido como Rua dos Judeus,
onde funcionou a primeira sinagoga das Américas, criada
por David Senior Coronel antes de 1936.
Até 1644, o
rabino Aboab da Fonseca e os judeus da Colônia
desfrutaram de grande tolerância e prosperidade. Porém,
com a expulsão dos holandeses do Brasil, eles voltaram a
ser perseguidos e expulsos por brasileiros e
portugueses. Muitos deles, desde 1654, voltaram para a
Europa, e outros permaneceram nas Américas, só que em
outros países. Um grupo de vinte e três judeus, entre
adultos e crianças, foi parar em Nova Amsterdã. Nessa
nova terra, fundaram uma comunidade que, mais tarde,
receberia o nome de Nova York.
A velha Rua
dos Judeus ainda existe no Recife, mas agora se chama
Rua Bom Jesus. Os prédios dessa rua foram transformados,
por decreto do prefeito da cidade, em locais públicos,
onde o Arquivo Judaico do Brasil fica guardado.
PÁSCOA JUDAICA
Pessach (do
hebraico, passagem),
é também conhecida como Páscoa
judaica.
De acordo com a tradição,
a primeira celebração de Pessach ocorreu há 3500 anos,
quando de acordo com a Torá, Deus enviou as Dez pragas
do Egito sobre o povo do Egito. Antes da décima praga, o
profeta Moisés foi instruído a pedir para que cada
família hebraica sacrificasse um cordeiro e molhasse os
umbrais (mezuzót) das portas com o sangue do cordeiro,
para que não fossem acometidos pela morte de seus
primogênitos.
Chegada a noite, os
hebreus comeram a carne do cordeiro, acompanhada de pão
ázimo e ervas amargas (como o rábano, por exemplo). À
meia-noite, um anjo enviado por Deus feriu de morte
todos os primogênitos egípcios, desde os primogênitos
dos animais até mesmo os primogênitos da casa do Faraó.
Então o Faraó, temendo ainda mais a Ira Divina, aceitou
liberar o povo de Israel para adoração no deserto, o que
levou ao Êxodo.
Como recordação desta
liberação, e do castigo de Deus sobre Faraó foi
instituído para todas as gerações o sacríficio de
Pessach, que abre as comemorações da festa dos pães
ázimos.
Matza é o substituto para
o pão durante o feriado judaico da Páscoa, quando comer
pão e produtos com fermentos é proibido, comida ou
bebida feita à base de trigo, centeio, cevado, aveia, ou
de seus derivados, mesmo que em quantidade mínima. A
única exceção é a matzá, que é o pão não fermentado,
pois foram tomadas precauções especiais para assá-la. Matzá
é o alimento básico durante Pessach. É um "pão ázimo",
uma espécie de bolacha não fermentada feita de farinha
de trigo e água.
CHANUCÁ OU HANUCÁ
Chanucá ou Hanuca (חנכה
hănukkāh ou חנוכה hănūkkāh) é uma festa judaica, também
conhecida como a Festa das luzes. Realizada em dezembro,
essa comemoração significa período de religiosidade e
também é sinônimo de dar e receber presentes.
Chanucá é uma palavra
hebraica que significa "dedicação" ou "inauguração". A
primeira noite de Chanucá começa após o por-do-sol do
24º dia do mês judaico de Kislev, Dezembro, e a festa é
comemorada por oito dias. Uma vez que na tradição
judaica o dia do calendário começa no por-do-sol, o
Chanucá começa no 25º dia.
Redação d'O Historiante
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