01/06/2012
Branca de
Neve, Cinema e Irmãos Grimm: cultura popular num cinema
pop.
Prof.
Pablo Michel Magalhães
As recentes produções cinematográficas Branca de Neve
e o Caçador e Espelho, Espelho Meu trouxeram
novamente ao gosto popular um dos contos mais difundidos
e apreciados de todos os tempos. A história da jovem
princesa atormentada e perseguida por sua madrasta má,
amiga de incríveis 7 anões e que, ao final, recebe o
beijo do príncipe e vive um final feliz para sempre, é
das mais conhecidas, principalmente pelo trabalho de
Jacob e Wilhelm, os irmãos Grimm, responsáveis por
realizar uma vasta coletânea de contos populares, muitos
deles escritos através de um trabalho de captação oral
direto com camponeses.
Imagem/Reprodução: Lily Collins como Branca de Neve no
filme Espelho, Espelho meu.
Branca de Neve passou ao universo infantil através dos
escritos dos irmãos alemães, mas nem sempre foi um conto para
crianças. No entanto, a personagem está longe de ser a princesa
guerreira de Branca de Neve e o Caçador, muito
menos a bela e sagaz cantora de Espelho, Espelho Meu.
Na fábula que Jacob e Wilhelm escreveram, que é
apenas uma das versões, ainda que das mais antigas,
Branca não tem mais que oito anos. Alguns toques
sombrios e um final macabro selam a história que, apesar
dos pesares, possui um final feliz.
Para começar nossa análise, devemos refletir sobre
alguns elementos que compõem este conto.
Os Grimm perpetuaram em sua coletânea uma história alemã
da Branca de Neve, fornecida por duas irmãs chamadas
Jeannette e Amalie Hassenpflug, de uma comunidade de
mineiros da Baviera. Nesta versão, Branca tem 7 anos ao
provocar a ira de sua madrasta rainha, pelo fato de ser
muito bela e todos repararem nisso. Por ciúmes, ela
encarrega um caçador de conduzir a pequena menina para a
Floresta Negra e lá matá-la, trazendo como prova de seu
trabalho os pulmões e o fígado da vítima. Tendo pena de
Branca, o caçador deixa que a princesa fuja, levando à
madrasta rainha os órgãos de um javali. Ao receber o
regalo, a mulher come-os ainda sangrando.
Nesse meio tempo, Branca de Neve encontra a casa dos
anões mineiros que aceitam recebê-la de bom grado,
contanto que ela cozinhe, passe, lave e costure para
eles.
Ao receber notícias de que a menina ainda respirava
sobre a Terra, a madrasta não poupa esforços para
destruir a vida da pequena. Na primeira tentativa,
disfarçada de vendedora de roupas, ela vai à casa dos
anões e tenta oferecer um corpete à menina; ao
oferecer-se para vestir Branca, a bruxa (pois realmente
a é, os Grimm assim a chamam) aperta o corpete para
matá-la, o que não funciona. Depois, com a desculpa de
pentear os belos cabelos da jovem, a madrasta utiliza um
pente envenenado, mas é desmascarada pelos anões
mineiros, que expulsam-na de casa.
Imagem/Reprodução: Iluminura de 1905, por Franz Jüttner.
Por fim, a famigerada maçã aparece. A madrasta,
disfarçada como sempre, induz Branca a comer um pedaço
da fruta, e esta logo cai em profundo sono. Ao chegarem
do trabalho, os anões tentam, sem sucesso, acordar a
pequena. Como ainda conservava as róseas
faces que sempre teve, eles decidem colocar o corpo em
um caixão de vidro, o que chama a atenção de um príncipe
que, de todas as formas, tenta persuadi-los a dar-lhe a cripta com o corpo de Branca.
Com pena, os anões cedem aos pedidos do rapaz. O
príncipe, feliz, pede que seus empregados retirem o
caixão do local. No entanto, um deles tropeça e deixa
cair o objeto. Nesse momento, o pedaço de maçã, que
estava entalado na garganta da menina, é expelido, e
Branca de Neve volta a viver.
Felizes e apaixonados, o príncipe e a princesa decidem
se casar, e preparam uma grande festa. A rainha madrasta
também foi convidada, e se preparou para se apresentar
lindamente no casamento. Ao chegar ao castelo, depara-se
com Branca de Neve ao lado do príncipe e, apavorada,
procura fugir, mas sua condenação já estaria por vir:
sapatos de ferro, na brasa, foram retirados e colocados
nos pés da vilã, e esta obrigada a dançar até a morte.
Para Giuliano Palmieri, pesquisador dessa fábula, muitos
elementos presentes no conto são, na verdade, referentes
às comunidades de mineiros da Itália, de uma região no
entorno do Monte Pore, no Tirol Italiano, chamada
Cordevole. Durante o século XVIII, ainda sob o Império
Austro-Húngaro, muitos mineiros alemães trabalhavam por
lá, um dos argumentos para a presença do conto na
Alemanha do século XIX dos Grimm.
Um costume bastante característico dessa região pode ser
um elemento da história de Branca de Neve. Nos contos
italianos, a pequena é enviada à floresta para que possa
servir de presa a um ser abominável. No costume das
comunidades mineiras do Monte Pore, quando uma jazida se
esgotava por completo, uma jovem das mais belas era
enviada ao fundo da mina, no intuito de transmitir à Mãe
Terra sua energia vital.
O professor Palmieri também assinala uma outra
possibilidade de inspiração: os mineiros da região de
Cordevole, em especial das Dolomitas, seriam homens de
baixa estatura, tendo em vista a estrutura encontrada
por escavações nessa área.
Além disso, persistiu durante muito tempo a lenda de
que, nos bosques da região de Cordevole, habitava uma
bruxa que possuía um grande conhecimento em venenos.
Seria esta a inspiração para a madrasta má?
Leia
também:
PALMIERI,
Giuliano. I Regni Perduti dei Monti Pallidi.
Roma: Cierre Edizioni, 1996. (Infelizmente, não há
tradução para o português).
BURKE,
Peter. A cultura popular na Idade Moderna. São
Paulo: Companhia das Letras, 2010.
(Texto do
Prof. Pablo Magalhães, da redação d'O Historiante)
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