O que aprendemos com Chris

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É possível observar que Chris Rock, apesar de ter vivido situações de racismo, não conseguiu ultrapassar a barreira da colonialidade

Joyce Oliveira Pereira
Mestre em História - UEMA

Como citar este artigo:
PEREIRA, Joyce Oliveira. O que aprendemos com o Chris (Artigo). IN: O Historiante. Publicado em 28 de Março de 2022. Disponível em: https://ohistoriante.com.br/2022/03/o-que-aprendemos-com-chris/. ISSN: 2317-9929.

Uma das principais questões do domínio Colonial se relaciona a diversas dimensões e formas de apresentação que a violência do colonizador impõe sobre os corpos dos colonizados. Albert Memmi discute em Sua obra clássica “o retrato do colonizado precedido pelo retrato do colonizador” as diferentes dimensões que a colonização submete os corpos.  Além da violência de fato e empreendida por diversos meios, a ideologia é fundamental no processo de afirmação e reprodução de sistema de denominação (MEMMI, 1967, p. 07).

O retrato do colonizado é construído com base na desumanização, e na mistificação desses sujeitos onde muitas vezes, os processos de violência, aí exemplo cultural constrói uma população que não consegue muitas vezes possui amor assim mesmo, mas pelo contrário ama o colonizado, porém, os colonizados não enxergam a si e isso os impede de perceber que nunca farão parte desse grande império (MEMMI, 1967, pp. 80-83).

Muito comentado desde ontem à noite nas redes sociais a postura de Will Smith, é possível observar que Cris Rock apesar de ter vivido situações de racismo, que são contadas  na série muito famosa no brasil “Todo Mundo Odeia o Chris,  possivelmente não conseguiu ultrapassar a barreira da colonialidade, já que ao ofender Jada Smith,  não percebeu questões de gênero que envolvem a violência sobre os corpos das mulheres negras em suas diferentes distâncias, em que o cabelo é um dos principais alvos do ódio racial: (e, nesse caso a ausência dele Também é um ponto a se pensar como uma invasão que faz parte das políticas de cabelo empreendidas pela branquitude (KILOMBA, 2019, p. 121)

Analisando esse ato de violência de gênero retorna-se a discussão colocada por Grada kilomba em seu livro “Memórias da plantação:  episódios de racismo cotidiano”: Nesse esquema, a mulher negra só pode ser o outro, e nunca si mesma. […] Mulheres brancas tem um oscilante status, enquanto si mesmas e enquanto o “outro” do homem branco, pois são brancas, mas não homens; homens negros exercem a função de oponentes dos homens brancos, por serem possíveis competidores na conquista das mulheres brancas, pois são homens, mas não brancos; mulheres negras, entretanto, não são brancas, nem homens, e servem assim, como a Outra da alteridade (KILOMBA, 2019, p. 191)”. Essa construção baseada em  misoginia e racismo coloca todos os dias mulheres negras em situações  diversas do racismo, seja ele estrutural ou cotidiano, que muitas vezes são silenciados.

E esse é um dos pontos principais de discussão do feminismo negro, que procura debater e compreender as questões que afetam as mulheres negras em suas especificidades devido à violência racial e misógina a que foram e que são submetidas durante a sua existência.  Dessa forma, é necessário o estudo de autoras como Sueli Carneiro,  Angela Davis,  bell hooks,  Lélia González,  Grada Kilomba, Joice Berth,  Carla Akotirene,  Djamila Ribeiro,  Giovana Xavier, intelectuais negras e, por isso debatem em suas obras questões essenciais para compreensão da situação da mulher negra  no continente americano e no Brasil.

O que aprendemos com o Chris? Há uma necessidade urgente e histórica acerca da compreensão de demandas de corpos que não se refletem diretamente aos nossos, mas, de forma indireta nossos corpos são construídos por eles e, redes de operações são tecidas para outros corpos. Dessa forma é extremamente necessário que exista esse questionamento subjetivo: como, meu eu, é/pode ser  responsável pela sustentação/destruição da colonialidade? 

Referências

KILOMBA, Grada. Memórias da plantação: episódios de racismo cotidiano. 1ª edição: Rio de Janeiro: Cobogó, 2019.

MEMMI, Alberti. Retrato do Colonizado precedido pelo retrato do colonizador. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1967.