Socorro! O Facebook, WhatsApp e o Instagram morreram

Compartilhe

A instabilidade virtual que paralisou as plataformas mais usadas no mundo fez muita gente se desesperar e questionar como sobreviver sem elas. 

Teresa Leonel
Mestra em Comunicação e Culturas Midiáticas (UFPB)
Professora no curso de Jornalismo em Multimeios (UNEB/Juazeiro-BA)

“De repente, descobri que a distancia que separa minha mãe de mim é de dois metros. Ela está no quarto ao lado. Estamos na mesma casa, mas eu tinha esquecido isso”. Essa é uma das inúmeras histórias e tantos outros memes que navegaram pela internet na segunda-feira, 04.10.21, depois que as plataformas Facebook, Instagram e WhatsApp ficaram sem funcionar por quase 7 horas.

Numa perspectiva escatológica, o mercado financeiro virou de cabeça pra baixo e até o dono dessas ferramentas, Mark Zuckerberg, chegou a perder quase US$ 6 bilhões em um dia[1]. E será mesmo que isso é o fim do mundo?

Pode-se dizer que o prejuízo pelo “blecaute” tem maiores consequências nas pequenas e médias empresas, nos trabalhadores que negociam através das redes, assim como, centenas de estudantes que usam as páginas como o principal meio de comunicação.

Continua após a publicidade


E o zap que não chamou? Imagine você: Mais de dois bilhões de pessoas, em mais de 180 países, usam o WhatsApp[2]. E por aqui, a estimativa é que 120 milhões de brasileiros tenham o aplicativo[3]. O uso e a prática são constantes: Falar com familiares e amigos, enviar textos, áudios, imagens e vídeos, fazer negócios, agendamento de consultas e tantos outros business.

Tudo ficou parado. Afinal, estamos todos conectados, agarrados, vinculados e dependentes. A relação vai do quintal da minha casa as conexões com o estreito de Gibraltar[4].  

No tribunal da internet surgiram várias teorias conspiratórias em torno do problema:

  1. Desvio de foco do magnata Mark Zuckerberg em função das denuncias da ex-gerente de produtos do Facebook, Frances Haugen, relatando que a plataforma está ciente de que usuários utilizam o espaço de forma nociva, e que prefere os lucros acima da segurança. A ex-funcionária (atuou na empresa de 2019 a 2021) diz que a rede social cria mecanismo que pode gerar prejuízos à sociedade e que os produtos são usados para facilitar o tráfico humano e também recrutar pessoas para cartel de drogas. (Uiii!!)
  2. Colapso do mercado financeiro, ou seja, provoca-se um caos para perder dinheiro e ganhar logo adiante.
  3. Zuckerberg quer mostrar que o mundo está em suas mãos….e por aí vai.

Comenta-se ainda que o apagão possa ter sido erro de DNS (Domain Name System, ou sistema de nomes de domínios). O DNS é o responsável por localizar e traduzir para números IP os endereços dos sites que digitamos nos navegadores. É a agenda de contatos da internet.

Bom, isso tudo não ficou claro e meio que sem respostas. O que foi mesmo que aconteceu? Não tá nada bem explicado. Apenas que Zuckerberg pediu desculpas ao mundo pelas limitações da ferramenta e, como sempre, está fazendo tudo que é possível para entregar o melhor serviço aos pobres mortais, como nós.

A instabilidade virtual que paralisou as plataformas mais usadas no mundo fez muita gente se desesperar e questionar como sobreviver sem elas. Por que a dependência de uma boa parte da humanidade está centrada no uso dessas ferramentas digitais que alimentam e dão novos significados ao viver em sociedade?

O teórico comunicador canadense, Herbert Marshall McLuhan (1911-1980) diria que “a aceitação dócil e subliminar do impacto causado pelos meios transformou-os em prisões sem muros para seus usuários” (MCLUHAN, 1964, p. 35). Esse autor jogou luz numa “época tão passada” sobre o nível de dependência da sociedade em relação aos meios de comunicação e na submissão das pessoas diante dos avanços tecnológicos. Ele defendeu que o “estudo dos meios, de uma só vez, abre as portas da percepção” e “que o globo já não é mais do que uma vila”(MCLUHAN, 1964, p.18)[5].

Continua após a publicidade


Longe de querer radicalizar a nossa dependência emocional, profissional, social e econômica nas plataformas é preciso pensar em que sociedade estamos inseridos e o modo (LATOUR, 2012) como nós, humanos, lidamos com a máquina e as relações que construímos a partir dessas imbricações.

Nessa sociedade tecnológica estar em off por algum tempo parece ser algo de outro mundo. Nada funciona. (?) Não sabemos se a entrega foi feita ou até mesmo se houve um pedido para isso. Imaginamos que todas as postagens do Insta ou do Face foram publicizadas, mas ninguém viu. As notificações das mensagens não “apitaram” no WhatsApp. Então tá tudo parado mesmo. Não conseguimos nem mesmo imaginar que o telefone funciona no modo tradicional: disca-se o número e diz, alô!.

Na teoria Ator-Rede, Latour (2012)[6] persiste em dizer que é preciso estender o sentido do social ao considerar associações entre atores humanos e atores não humanos. Nessa relação permitimos rastros. Fazemos conexões entre nossos pares e outros contatos. Desenhamos caminhos que proporcionam novas relações e/ou deletamos configurações sociais que não têm nada a ver com o que pensamos.

Realmente não construímos uma sociedade pensando no coletivo. Ao contrário. Definimos e estabelecemos critérios de exclusão, alimentamos o individualismo e renegamos a pluralidade. No entanto, diante do apagão tecnológico somos todos iguais na relação de problemas. Embora, a diferença se apresente no quantitativo de bens, ganhos e perdas financeiras. Mas, a relação humana com a máquina não avançou em nada.

Vamos construindo pontes e muitas vezes barreiras. Somos modernos (LATOUR, 1994)[7] quando pensamos em questionar e definirmos que o modo de existência das sociedades anteriores não cabe dentro do nosso modo atual. Estabelecemos uma relação estanque para aqueles que pensam diferente de nós e não abrimos espaço para a pluralidade dos diversos modos. Está posto.

O que é mesmo que vamos fazer quando tivermos um novo apagão nas plataformas?

Sobre a colunista

Teresa Leonel é doutoranda em Comunicação no PPGCOM da UFPE. Mestra em Comunicação e Culturas Midiáticas pela UFPB. Jornalista, radialista e cientista social. Professora no curso de Jornalismo em Multimeios da Universidade do Estado da Bahia, em Juazeiro. Autora do livro Blog do Noblat: estilo e autoria em jornalismo (Appris: 2015). Área de pesquisa: jornalismo, mídias sociais, narrativas noticiosas em WhatsApp, Teoria Ator-Rede


Notas

[1] https://www.seudinheiro.com/2021/empresas/facebook-apagao-zuckerberg-fortuna/

[2] https://www.whatsapp.com/about

[3] https://resultadosdigitais.com.br/blog/redes-sociais-mais-usadas-no-brasil/

[4] O estreito de Gibraltar é um estreito que liga o mar Mediterrâneo com o oceano Atlântico, situada entre o extremo sul da Espanha e o Marrocos, no noroeste da África. Tem 58 quilômetros de comprimento e estreita-se a 13 quilômetros de largura entre a ponta Marroquina e a ponta Cires. Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Estreito_de_Gibraltar. Acesso: 6 out 2021.

[5] MACLUHAN, Marshall.  Os meios de comunicação como extensões do homem.

Tradução de Décio Pignatari. São Paulo: Editora Cultrix, 1964.

[6] LATOUR, Bruno. Investigação sobre os modos de existência. Une anthropologie des Modernes  ”,  Lectures [Online], The reports, publicado em 12 de dezembro de 2012, consultado em 08 de outubro de 2021. URL: http://journals.openedition.org/lectures/10133; DOI: https://doi.org/10.4000/lectures.10133

[7] LATOUR, Bruno. Jamais fomos modernos: ensaio de antropologia simétrica. Rio de Janeiro: Editora 34, 1994.