Síndrome de Down
Entrevista com
a psicopedagoga
Prof.ª Dr.ª
Margareth Maria Neves dos Santos de Oliveira
Apresentação
Margareth Maria Neves dos Santos de Oliveira é graduada em Pedagogia pela Universidade do Estado do
Rio de Janeiro (1991) - UERJ, com habilitação para o
Magistério para pessoas com deficiência intelectual. Psicopedagoga pela Universidade Candido Mendes (1998).
Mestre em Educação (2003) e Doutora, também em Educação
(2010), tendo realizado ambos os Cursos na UERJ.
Currículo lattes: http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/busca.do
1- O que é síndrome de down?
É necessário deixar claro que a síndrome de down não é
uma doença, como muitas pessoas pensam. É sim, uma
alteração genética cromossomial, do par 21, produzida
pela presença de um cromossomo a mais em cada célula,
também conhecida como trissomia do 21, que,
atualmente, pode ser confirmada desde o período de
gravidez, por meio do exame denominado Amniocentese, dentre
outros, pelo qual é analisado o cariótipo do indivíduo,
conforme demonstrado na ilustração a seguir:
O nome desta síndrome foi dado em homenagem ao médico
John Langdon Down, que, em 1866, percebeu que havia
nítidas semelhanças fisionômicas entre certas crianças
com atraso mental.
A Síndrome de Down pode apresentar variações conforme as
formas da alteração cromossomial, sendo três os tipos
mais comuns, a saber: trissomia simples, translocação, e
mosaico.
• Na trissomia simples, que ocorre em cerca de 95% dos
casos, o indivíduo possui 47 cromossomos em todas as
células;
•Na translocação, presente em cerca de 3% dos casos, o
cromossomo extra do par 21 fica "grudado" em outro
cromossomo, dando a impressão de haver apenas 46
cromossomos;
• No mosaico, que acontece em cerca de 2% dos casos, a
alteração genética compromete apenas parte das células,
ou seja, algumas células têm 47, devido à trissomia, e
outras, 46 cromossomos.
É importante que, no caso da síndrome de down por
translocação, os pais submetam-se a um exame genético,
pois eles podem ser portadores da translocação e têm
grandes chances de ter outro filho com a síndrome.
Características dos Indivíduos que apresentam a Síndrome
de Down
A trissomia do cromossomo 21 é a causa mais comum de
atrasos de desenvolvimento psicomotor (cerca de 1/3 dos
casos). Cientificamente, está comprovado que a síndrome
de down pode manifestar-se igualmente em todas as
raças, sem
nenhuma relação com o nível cultural, social, ambiental,
econômico etc com uma
incidência de um para 800 nascimentos e está associada
principalmente à idade materna (em gestantes que têm 35
anos ou mais (quando os riscos de se gestar um
bebê com a síndrome aumenta de forma progressiva), mas
também em mães com menos de 18 anos, pois mulheres mais
jovens geram mais filhos).
É caracterizada pela aparência física e comprometimento
intelectual. A única característica comum a todas as
pessoas que têm a síndrome de Down é o déficit
intelectual, mas elas podem apresentar as demais
características, todas ou apenas algumas, podendo ser
mais acentuadas em alguns indivíduos do que em
outros, tais como:
• Excessiva flexibilidade nas articulações, como
consequência de hipotonia (flacidez muscular);
• Cabeça um pouco maior que o normal e com aparência
arredondada, com a parte posterior levemente achatada. O
processo de fechamento das fontanelas é mais moroso,
devido a apresentarem-se com uma maior extensão;
• Cabelo liso e fino. Algumas crianças podem apresentar
áreas com falhas de cabelo (alopecia parcial), ou
ausência total, (alopecia total), causada por stress;
• Pescoço curto e de aparência larga e grossa com pele
redundante na nuca;
• Rosto com contorno achatado e nariz pequeno, devido
aos ossos faciais serem pouco desenvolvidos e o osso
nasal ser geralmente afundado;
• Olhos amendoados, semelhante aos orientais,
contendo fissuras palpebrais oblíquas, e com pontos
brancos nas íris;
• Orelhas pequenas e de implantação baixa, com a borda
superior da orelha dobrada;
• Boca pequena, podendo mantê-la aberta e com a língua
protusa e com estrias,. devido à hipotonia;
• Erupção dos dentes de leite geralmente tardia, podendo
apresentar formato pontiagudo;
• Cardiopatia congênita;
• Mãos e os pés pequenos e grossos, com dedos geralmente
curtos. Espaço excessivo entre o hálux e o segundo dedo
do pé. Prega palmar transversal única (prega simiesca).
• O desenvolvimento da genitália pode se apresentar da
seguinte forma: nos homens, pênis pequeno e há
criptorquidismo (ausência
de um ou dos dois testículos do escroto), nas
mulheres, lábios e clitóris pouco desenvolvidos. Os
meninos são estéreis, e as meninas ovulam, embora tenham
períodos irregulares.
2- Sabemos que lidar com crianças que possuem
necessidades especiais é algo delicado. Em sua opinião,
a formação universitária, hoje, capacita os
profissionais da educação para este desafio?
Acredito que não. Constatamos hoje uma grande defasagem
de conteúdos nos diferentes graus de ensino,
principalmente na formação do professor que,
anteriormente acontecia inicialmente no Ensino Médio,
como uma formação técnica, podendo-se aprofundar os
conhecimentos teóricos e práticos por meio dos cursos
adicionais e, posteriormente das graduações. A maioria
das escolas de nível médio para formação de professores
deixaram de existir para por em prática o disposto no
artigo 62 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional nº 9394/96, que indica que a formação de
docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível
superior, em curso de licenciatura, de graduação plena,
em universidades e institutos superiores de educação,
mesmo admitindo-se ainda, como formação mínima para o
exercício do magistério na educação infantil e nos 5
(cinco) primeiros anos do ensino fundamental, a
oferecida em nível médio na modalidade normal.
Historicamente, constatamos que o fracasso educacional
de muitos alunos se deu pela ausência de disciplinas
pedagógicas nos currículos de formação de professores
das disciplinas de formação geral e de cursos técnicos,
tanto que houve a reformulação da LDB também referente a
este quesito, demonstrando a necessidade desse tipo de
formação, no sentido de os professores tornarem-se
educadores, com olhos não apenas no conteúdo, mas em
todo o processo de ensino e aprendizagem.
Mesmo com o aumento do quantitativo de professores com
formação em cursos de especialização Lato Sensu e/ ou
Stricto Sensu, como Mestrado e Doutorado, percebe-se o
“não saber fazer” desses profissionais frente a alunos
sem qualquer tipo de deficiência, e principalmente
quando esses as têm. Muitos professores estão presos à
medicalização do ensino, processo historicamente
construído, não conseguindo perceber os diferentes modos
de aprender que cada indivíduo apresenta. Assim sendo,
urge a necessidade de aprofundamento de pesquisas, por
todos os professores, em suas salas de aula, como campo
investigatório do processo de ensino e aprendizagem e
das variáveis que o influenciam positiva ou
negativamente. Para tanto, o professor deve ter o olhar
do cientista, em ciclo e não estagnado, ou seja,
observando e registrando todas as situações do cotidiano
escolar, bem como todos os personagens envolvidos no
processo (toda a comunidade escolar), com o objetivo de
levantar hipóteses e possíveis soluções, mantendo
permanentes discussões e análises com as situações
observadas para levantar novas hipóteses sobre o
aprendente e o ensinante, que podem ser o professor e o
aluno, dependendo do momento.
3- De que forma família e escola podem atuar para que a
aprendizagem de alunos com síndrome de down possa ser
significativa?
Da forma que família e escola devem atuar frente a
qualquer aluno, ou seja, em parceria. O aluno deve ser o
centro das atenções de ambas as partes, sendo que elas
devem realmente caminhar em prol do aluno e não como se
fossem rivais, como acontece na maioria das vezes.
Família e escola devem caminhar juntas, para que ambas
conheçam esse aluno sob o enfoque de cada contexto, pela
forma que ele se apresenta em cada espaço. A escola deve
estimular a família a acreditar no desenvolvimento
educacional, psicomotor e não apenas no social do aluno
e vice e versa.
4- Em um contexto nacional, podemos dizer que nosso
ensino público/particular está preparado para englobar
crianças com síndrome de down, provendo estas de uma
aprendizagem de qualidade?
Diversas leis federais, estaduais e municipais indicam
os direitos gerais de pessoas com deficiência,
principalmente no que tange à Educação, tais como a
Constituição, a LDB, o ECA, a Lei nº 7.853/89, dentre
outras. Desde os anos 1980, com o acontecimento de
vários movimentos de familiares e amigos de pessoas com
deficiência em prol de seus direitos, iniciaram-se as
discussões sobre inserção, integração e, mais
recentemente, inclusão. Já se passaram mais de 30 anos
desde seu início e ainda estamos perguntando se as
escolas estão ou não preparadas para atuar com crianças
com deficiência. Posso afirmar que falta vontade
política, mas falta também vontade e compromisso dos
profissionais que trabalham na educação. A preparação se
dá junto do processo, ao longo de seu caminhar. Pensamos
nas dificuldades quando elas aparecem e não previamente.
Como quando o chuveiro queima a resistência em um dia
muito frio de inverno. Portanto, o ideal é que tenhamos
disciplinas que nos capacitem para saber um pouco mais
das características condicionadas por cada uma das
deficiências que possam surgir, infinitas talvez, porém
não podemos nos utilizar do argumento de não termos sido
formados para trabalhar com pessoas com deficiência,
pois estamos lidando com gente, e é o modo que cada um
aprende que deve ser nosso foco pedagógico, e não com a
deficiência.
5- De que forma a aprendizagem em crianças com Down
acontece? (Ressaltar aspectos como consistência e ritmo
de aprendizagem, se são os mesmos do que em crianças que
não apresentam tais características).
Como já referenciado, a síndrome de Down tem a
deficiência intelectual como única característica comum
entre as pessoas que a apresentam. Isto não quer dizer
que elas não aprendam. O que ocorre é uma morosidade
maior ao processo de construção de conhecimento. O que
deve ser feito é estimular de todas as formas e maneiras
os indivíduos que têm a síndrome, de preferência o mais
cedo possível e em todas as situações e espaços. O mundo
hoje é tecnologia pura. Não podemos deixá-la de lado, ao
contrário, devemos utilizá-la em nossos planejamentos e
práticas diárias, para e com os alunos, sejam elas de
baixo ou alto custo, tais como: jogos de corpo, de
trilha, de concentração, de regras, dentre outros, a
televisão, o rádio, o jornal, o computador, o celular, o
tablet, o vídeo-game etc. Algumas crianças que têm essa
síndrome podem apresentar comorbidades, ou seja, outras
patologias associadas, como psicoses infantis,
deficiências sensoriais e físicas. Dependendo do caso,
podem apresentar comportamento muito destoante ou
agressivo, ou um comprometimento cognitivo muito
aprofundado. Mesmo nesses casos, devemos investir na
criança e em nosso trabalho de forma a tentar
apresentar-lhe o mundo que o cerca para que ele se
beneficie dele, satisfatoriamente, de alguma forma.
6- Há implicações de aspecto social que a Síndrome de
Down pode exercer sobre as relações pessoais dos
portadores de tal distúrbio genético?
Nossa sociedade é cultural e historicamente
preconceituosa. Todo comportamento que foge ao
socialmente considerado padrão, pode ser condenado.
Ainda hoje nos deparamos com os noticiários divulgando
crimes contra índios, homossexuais, mulheres, pessoas
que vivem na miséria, menores de rua... Nesse aspecto,
no que tange às pessoas com deficiência, não seria
diferente, principalmente devido ao fato de as pessoas
que têm a síndrome, terem sua deficiência percebida pela
característica mais marcante: o aspecto fisionômico.
Numa visão holística, a sociedade vem caminhando para
melhorar as relações frente à diversidade, em relação
principalmente ao respeito que cada indivíduo ou animal
merece, pelo simples fato de ser um ser. Todavia, ainda
temos um caminho longo a trilhar para alcançarmos o
respeito mútuo.
7- Em sua opinião, como podemos promover uma inclusão
social consistente e igualitária dos portadores de
Síndrome de Down na sociedade, através da educação?
A LDB, não só a de nº 9394/96, mas também as anteriores,
indica que o Estado e as pessoas devem promover a
conscientização para exercício pleno da cidadania. Esta
máxima deve ser aplicada por todas as pessoas para si e
para o outro, pois muitas vezes, por mais formação que
tenhamos, não somos cônscios e não exercemos mínima,
quanto mais plenamente nossa cidadania, se assim nos
comportamos como podemos promovê-la? Neste sentido, a
nossa fala deve condizer com a nossa prática. Devemos
apregoar a inclusão, divulgando os direitos de todos,
mas buscar todas as formas dela ocorrer realmente, seja
estudando sobre a temática, seja informando nossos
alunos e seus familiares de seus direitos, seja
oferecendo recursos e estratégias lúdicas e educacionais
personalizadas a cada um dos alunos, seja refletindo
sobre nossa prática pedagógica e relacionamento com as
pessoas em geral em todos os espaços de convivência e de
atuação.
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