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19/01/2015 - GAUGAMELA, 331 A.C: UMA BATALHA DE CINEMA QUE MERECE TRILHA SONORA.

 

Prof.ª Ailma Cintia

 

A Batalha de Issos, entre Alexandre, o Grande, e Dario da Pérsia. Mosaico, cópia romana do original helênico feito por Philoxenos da Eritréia.

 

(Antes de começar a ler esse texto dê play na canção The Drums Of Gaugamela. Pronto, agora pode ler.)

 

Gaugamela é considerada por estudiosos e românticos a maior batalha da vida intensa e breve de Alexandre, o grande. Com um enredo que daria um roteiro de cinema (e deu!), a luta mais importante da disputa entre persas e macedônios pelo domínio do mundo antigo foi marcada por reviravoltas e ganha por boa tática e estratégia de guerra.

O mundo antigo, radicado nas regiões da África e do Oriente Médio, foi caracterizado basicamente por surgimento de grandes impérios que eram em seguida suplantados por império mais fortes. Não era admissível a coexistência de dois grandes impérios. O desejo era ser dono de todo mundo. Um sentimento que prevalece ainda hoje. Aí estão Pink e Cérebro para nos provar que não basta vencer, é preciso dominar o mundo!

Em meados dos anos 300 a.C a Pérsia se constituía o grande império mundial após as grandes conquistas de Ciro e a subsequente manutenção do reino por parte de seus sucessores através de um complexo sistema burocrático e de um grande exército. A Pérsia era a dona do mundo conhecido, no entanto pela extensão de seu império vinha se enfraquecendo em algumas regiões do mundo. Simultaneamente na Grécia o modesto reino da Macedônia sob a direção do Rei Felipe II passava a se fortalecer local e regionalmente e expandir seus limites territoriais e de influência política. Como tudo mais na antiguidade Felipe teve uma morte suspeitíssima onde persas, gregos e até sua esposa foram considerados culpados e seu filho Alexandre, ainda extremamente jovem assumiu o poder.

 

Filipe II da Macedônia e Alexandre, o Grande.

O fato é que o que Alexandre tinha de jovem tinha de arrogante e grande general. Em pouco tempo com uma visão de guerra aguçada e um forte carisma com seu exército, Alexandre expandiu os limites e em pouco tempo passou conquistar importantes territórios a exemplo do Egito.  As relações entre a Pérsia e a Macedônia já eram hostis na época de Felipe II e foram se acentuadas com Alexandre. Segundo estudiosos como Funari, o novo poderia macedônico implicava necessariamente em um provável conflito com a Pérsia.

No xadrez a lógica é que não podem coexistir dois reis. Na Antiguidade também. A partir de 340 a.C a Pérsia e a Macedônia entraram em conflitos propriamente ditos. Dario e sua superioridade numérica x Alexandre e seu exército fidelizado e atuando a partir de interessantes táticas de guerra. Em 334 e 333 a.C em Granico e Isso respectivamente, os macedônios esmagaram os persas. Dario III saiu destes conflitos desmoralizado. Alexandre mais arrogante e com pretensão a ser filho dos deuses (sim, há muitas histórias em que Alexandre tenta se assemelhar a Hércules e Aquiles).

Consciente de que a hostilidade com a Macedônia não estava terminada, Dario III se preparou para o próximo conflito. Preparou o seu exército, escolheu seu campo de batalha e em suma garantiu para si todas as prováveis vantagens do conflito. Gaugamela foi um campo de realização de profecias e ações dos deuses para ambas as partes (profecias no Egito, eclipses e outros sinais dos deuses). Há muitas lendas e coincidências que envolvem este episódio da história dos dois exércitos.

O palco do novo conflito seria na região de Arbela, hoje no Iraque. O campo de Gaugamela foi marcado por redefinir a mesa de xadrez do mundo antigo. Esta batalha é marcada por especulação e propaganda. Como nos dias atuais em que nas manifestações os organizadores afirmam que participaram 1 milhão de pessoas e a polícia militar diz 160 mil, os estudiosos não tem o número preciso dos que batalharam em Gaugamela. Falam de 200 mil  a  1 milhão de persas contra 40 mil macedônios. Há outras estatísticas que discordam desses números, no entanto todos concordam que Gaugamela foi a maior batalha para ambos pois para os persas decretou o fim de seu império e para os macedônios o impulso para dominar de vez o mundo. O fato é que Dario tinha um exército MUITO superior em número e estrutura bélica ao que Alexandre tinha. Estrategicamente falando o rei persa escolheu uma planície para a batalha o que favorecia sobremaneira o seu exército com seus carros e cavalos. A planície também ajudava na formação do enorme exército persa, o que dava uma vantagem considerável.

Do ponto de vista do provável Dario estava em vantagem. Ocorrida em 331 a.C Alexandre partiu para atingir o coração do império persa e encontrou um rei agressivo que queria retaliação das derrotas anteriores, com um terreno preparado artificialmente para melhor desempenho dos carros. Gaugamela (a casa do camelo) favorecia as manobras da cavalaria e seus carros de guerra, porém também colaborava para que Alexandre realizasse manobras de guerra com sua experiente cavalaria.

Com um desenlance que só um bom enxadrista compreende por completo (coisa que não sou!) Gaugamela revelou a supremacia da tática e estratégia de guerra como bases para uma vitória. Um general que sabe ler as vantagens e desvantagens do inimigo e usar isso, eis o que vence a guerra (logo eu que não sei jogar nada seria um péssimo general!).

 

 

Em resumo o exército persa passou uma noite em vigília e ficando obviamente cansado para no dia seguinte ser surpreendido pelo exército macedônio descansado e pronto pra batalha. O exército ENOOORRRMMEEE de Dario III tinha como principal característica protege-lo ao máximo na batalha. O rei ficava no fim da formação protegido pelo seu esquadrão real. A tática de Alexandre era que uma de suas companhias se infiltrasse na formação persa e atacasse Dario.

Os persas por sua vez aproveitaram-se da planície e o espaço que oferecia para atacar os macedônios pelas laterais com seus carros e outras tecnologias da época. E a dança começou. Alexandre moveu sua Companhia de Cavaleiros para a direita obrigando Dario mover-se para a esquerda (o que abalou a sua formação um pouco). Dario tentou atacar a infantaria pelos lados mas foi surpreendido pela incursão da falange macedônica (que era uma formação retangular de lanceiros que posteriormente ficou famosinho entre os romanos). A falange distraiu as tropas persas e Alexandre com um número MUITO menor atacou com os seus cavalos a ala esquerda do exército de Dario.

Dario por sua vez investiu seus carros contra a falange macedônica. A estratégia dos carros que eram equipados com armas capazes de cortar pernas de homens e cavalos. No entanto Alexandre tinha outra carta na manga: arqueiros dispostos a lançar suas flechas contra os carros persas e inutiliza-los antes que eles fizessem um grande estrago na infantaria macedônica. Os arqueiros aliados a grande habilidade de esquiva da falange desviaram pânico ou baixas no grupo de Alexandre.

O fracasso na utilização dos carros gerou angustia no exército persa que ficou paralisado diante das manobras de guerras das companhias de Alexandre (falange atacando de um lado, cavaleiros de outro). A ala esquerda dos persas foi derrotada e inutilizada e Dario III demonstrando grande capacidade de liderança fugiu. Isso mesmo. FUGIU. Deu uma fugidinha. Au revoir! O exército persa percebendo a ação do seu rei conclui que tinha perdido a batalha. O que não impediu um número absurdo de mortes, que aconteceram em sua maioria durante a retirada desesperada dos persas.

Para os macedônios a hora mais difícil foi quando Alexandre precisou decidir entre auxiliar o seu próprio exército que continuava em batalha com a ala direita dos persas ou perseguir o rei fugitivo. A Companhia de Cavalaria de Alexandre (que lutava na dianteira dos cavaleiros) saiu em auxílio aos companheiros que sofriam baixas diante dos persas. Estes resolveram bater em retirada quando viram o reforço macedônio e a fuga do seu próprio rei.

 

 

 

Gaugamela portanto foi um divisor de águas respaldando que:

  1. Uma boa estratégia e um exército entrosado é mais eficiente que um número grande sem uma liderança astuta;
  2. O exército persa não vivia mais dias de glória, e após essa batalha não conseguiu mais deter Alexandre (se não com pequenas insurreições e revoltas localizadas dentro do vasto império persa que Alexandre tomou para si);
  3. O exército macedônio com um jeito de atuar e se relacionar internamente (Alexandre conhecia os soldados; haviam laços de sangue ou afetivos entre boa parte do exército; e o general era famoso por seu carisma e capacidade de incentivar e arregimentar pessoas a sua causa) mudou o jeito de fazer guerra.

Gaugamela é um caso ímpar não apenas pela sua magnitude (número de carros, soldados e mortos) mas também pela efetivação da importância das decisões táticas corretas para garantir a vitória. Esta batalha definiu estratégias bélicas para a posteridade a exemplo da manobra envolvente e as incursões da falange macedônica.

Gaugamela foi o fim de Dario III e toda a tradição persa e o ápice da força de Alexandre que aumentaria sua ambição a níveis megalomaníacos ganhando o seu lugar de destaque na história.
Tanto os livros, quanto os vídeos informativos (Beijos BBC!) quanto o cinema romantizaram esta batalha. Elevaram os dois lados a uma explicação maniqueísta com mocinhos e vilões. E marcaram o nosso imaginário com direito a trilha sonora e Colin Farrel interpretando o moço que queria dominar o mundo, idealista e cheio de sonhos.

 

Referências

TOYNBEE, Arnold J. Helenismo, história de uma civilização. Tradução de Waltensir  Dutra. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1963.

FUNARI, Pedro Paulo. Grécia e Roma. São Paulo: Contexto, 2004.