11/04/2013
O ABC da imprensa brasileira.
Prof. Juliano Mota
Campos
(Clique aqui e confira mais
textos deste autor)
EXTRA! EXTRA! O Historiante anuncia uma série de quatro
textos que contarão as primeiras linhas da imprensa no
Brasil, sendo o jornal a nossa matéria de capa.
Analisaremos (em primeira mão!) quais foram os jornais
pioneiros na arte de informar, seus protagonistas, os
fatos dessa história, que mereceram a primeira página, as
relações políticas, econômicas e culturais que ajudaram
a compor os mais polêmicos e importantes editoriais.
Esse texto inicial fará uma incursão pelo período
colonial como gênese da produção impressa, refletindo
sobre o contexto
político e social em que se instalou a imprensa em
terras tupiniquins, a quê e a quem se reportavam esses
periódicos e com quais objetivos. Para abrir os
trabalhos na nossa redação é necessário, primeiramente,
abordar sobre as origens do jornal e da imprensa no
mundo e na América Latina, bem como as formas de
comunicação que antecederam estes escritos na América
portuguesa.
A palavra jornal tem sua origem no latim “diurnális”,
que significa “dia”, “diário”, ou seja, o relato de um
dia de atividades. Os governos foram os responsáveis
pioneiramente por criar, distribuir
e reproduzir a escrita, desenvolvendo esta sob um
suporte de cera ou de argila com os selos cilíndricos e
cunhas, encontrados nas mais antigas cidades
mesopotâmicas na Idade Antiga. A primeira publicação
regular foi a Acta Diurna, publicação
oficial do Império Romano, criada no ano de 59 A.C.,
durante o governo imperial de César, que falava do cotidiano
popular, conquistas militares, ciência e política. Como
não existiam tecnologias de impressão no Império Romano
e nem mesmo papel em quantidade suficiente, a Acta
Diurna era publicada em grandes placas brancas de papel
e madeira (estilo Outdoor). Estas placas eram expostas
nas principais praças das grandes cidades para que as
pessoas lessem de graça; os textos eram transportados a
pé ou a cavalo, chegando dias atrasados e não publicavam
noticias contrárias aos interesses do imperador.
Na transição da Idade Média para a Moderna, os jornais e
o jornalismo realizaram um grande salto tecnológico: a
prensa de papel reinventada pelo Alemão Johannes
Gutenberg. Isto possibilitou que o trabalho que antes
era feito manualmente pudesse ser feito por máquinas,
tornando a publicação de livros e jornais muito mais
ampla, rápida e barata. Graças a esse avanço, o “Notizie Scritte”, publicado em Veneza (1556), tornou-se o
primeiro jornal mensal. O primeiro semanário foi o “Relation”,
impresso na Antuérpia (1605), e o “Post-och Inrikes
Tidningar”, publicado pela primeira vez na Suécia, em
1645, e que existe até hoje, sendo considerado o jornal em
circulação mais antigo do mundo. Apesar de alguns impressos
circularem no Peru em 1594, era o “Publick Benjamin
Harris”, o primeiro jornal das colônias americanas
(1690), sendo impresso em três folhas, e uma quarta página
era deixada em branco para que os leitores pudessem
adicionar suas próprias notícias, sendo que, depois,
repassavam o exemplar a outros leitores.
Mesmo com o surgimento constante de jornais (comparável
aos que se editavam na Europa) em território
latino-americano – a exemplo da Gazeta de México y
Noticias de Nueva España (1722) - , na América
portuguesa a escrita impressa ainda estava ausente,
ficando ao encargo da população local lançar mão de
outros meios para comunicarem-se. Segundo Isabel
Lustosa, era através do diferente badalar dos sinos da
cidade do Rio de Janeiro – que eram inúmeros – que esse
cotidiano se organizava e as pessoas se informavam. A
igreja também contribuía para a circulação da informação
anunciando atividades religiosas e civis depois das
missas, assim como as fontes de distribuição de água e o
Largo da Polé, hoje Praça XV, no centro do Rio, onde o
Senado da Câmara pregava avisos para informar aos
habitantes da cidade sobre fatos importantes. Os
"bandos" que circulavam pelas ruas propagando os avisos
públicos também auxiliavam na comunicação com a
população.
Quem começou a dar os primeiros passos para a instalação
da imprensa no Brasil foi Antônio Isidoro da Fonseca em
1746, dono do primeiro prelo a comprovadamente funcionar
nestas terras. Ele transferiu sua oficina de Lisboa para
o Rio de Janeiro e, com a devida autorização do
governador Gomes Freire, imprimiu dois textos, um dos
quais de apenas uma página. Apesar disso, conforme
afirma a historiadora Isabel Lustosa, uma Ordem Régia, editada meses
mais tarde, mandou sequestrar e enviar as letras de
imprensa de volta ao Reino, por conta e risco de seus
donos. O primeiro jornal a circular no Brasil foi o
Correio Braziliense (1°de junho 1808), editado por
Hipólito José da Costa, impresso em Londres, trazido de
navio e distribuído na colônia. O termo Braziliense refere-se
aos portugueses nascidos ou estabelecidos no Brasil e
que se sentiam vinculados ao país como a sua verdadeira
pátria, o que demonstrava que Hipólito da Costa queria
enviar sua mensagem preferencialmente aos leitores do
Brasil.
Segundo o professor Antonio Fernando Costella,
o Correio seria mais parecido com uma revista, por ter
muitas páginas, cerca de 200, e poucas notícias
urgentes. O jornal tinha todo o tipo de informações, não
era só político ou doutrinário, dividido em seções:
política, comércio, artes, literatura, ciências, miscelânea e,
às vezes, correspondência. Por
meio do Correio Braziliense, Hipólito da Costa formulava
políticas públicas para o Brasil, criticava a
administração portuguesa, a falta de liberdade e o
monopólio comercial, defendia a liberdade de imprensa e
via o trabalho escravo como nocivo à economia, costumes,
cultura e educação. Para a historiadora Isabel Lustosa, Hipólito da
Costa é um exemplo da propagação de ideias
anti-absolutistas no Brasil, que passaram a ter no Correio Braziliense um veículo de expressão, que mais tarde
auxiliaria na independência brasileira.
Ao contrário dos principais países latinos americanos, o
Brasil entrou no século XIX sem tipografia, bibliotecas
e universidades, sendo esquecido pelas autoridades
portuguesas até as invasões napoleônicas que forçaram a
vinda da família real para os trópicos tupiniquins. Em
pouco tempo, a colônia atrasada, onde não era permitido
qualquer tipo de impressão por ordem do Rei, passou ser
sede do reino. A partir da necessidade da Corte, de
comunicar-se com os súditos, D. João VI baixou o
decreto de 13 de maio de 1808, determinando a instalação
da Impressão Régia no Rio de Janeiro (Real Officina
Typographica) com o objetivo de publicar os atos
oficiais do governo. A primeira tipografia brasileira (que viria a bordo da nau
Medusa) publicou alguns livros
e decretos até que, em 10 de setembro de 1808, lançou
a Gazeta do Rio de Janeiro. O jornal era redigido por
frei Tibúrcio José da Rocha, publicava atos do governo,
notícias sobre a Europa traduzidas de jornais
portugueses e ingleses, e notas sobre o cotidiano da
cidade.
Na Bahia em 1811, surgiu o periódico A idade de Ouro no
Brasil, com a licença de D. João VI. Para a pesquisadora Mary Del Priore, o jornal baiano ofereceu uma dimensão das
mudanças estruturais do país após a chegada da Corte,
sendo que este propiciou um realce no desenvolvimento do
interior do Brasil, com obras públicas, como a abertura
de estradas, construções de pontes e mudanças na
comunicação entre as províncias, caracterizando-se como
um grande espectador dessas transformações. Apesar das
transformações econômicas, sociais e políticas ocorridas
no Brasil desde a chegada família real, a situação da
imprensa não se alterou antes de 1821. Nesse ano, devido
às decisões das Cortes portuguesas, as restrições à
imprensa diminuíram, enquanto no Brasil as tensões que
levariam à independência faziam florescer uma imprensa
política, polarizada (como as posições políticas do
momento).
Apesar do seu nascimento tardio, a imprensa brasileira
contribuiu para a difusão da cultura, circulação de
ideias, formação de um Estado brasileiro e mediação de
debates em um momento em que o escrito ainda era
novidade. A postergação do ensino superior, manufaturas,
independência política e abolição da escravatura - assim
como foi a da imprensa - gerou consequências maléficas
à nossa sociedade (analfabetismo, concentração da renda,
discriminação étnico-social), de forma que o exercício
pela busca do conhecimento, pela defesa das liberdades,
inclusive a de imprensa, e o ato politicamente critico
de opinar, pode fazer com que não só a imprensa
brasileira, mas a sociedade como um todo possa sair da
infância permanentemente tutelada e dar vivas (pelo
dito e escrito) à maturidade democrática.
Leia
a sequência:
Texto 2 -
Entre redações e realezas:
A imprensa brasileira e o milagre da
multiplicação das notícias no período imperial.
VER TAMBÉM:
http://www2.uol.com.br/historiaviva/artigos/gutenberg_nao_inventou_a_imprensa.html
BAHIA, Juarez. Jornal, História e Técnica, vol. I –
História da Imprensa Brasileira, São Paulo: Ática,
1990, 4ª ed.
CAPELATO, Maria Helena R.. Imprensa e História no
Brasil. São Paulo: Contexto/EdUSP, 1988.
LUSTOSA, Isabel. O
Nascimento da Imprensa Brasileira. Rio de Janeiro:
Jorge Zahar, 2003.
(Texto do Prof. Juliano
Mota Campos, da redação d'O Historiante).
(Clique aqui e confira
mais
textos deste autor)
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