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19/03/2013
Série Primeira
Guerra Mundial
Texto 3 - Trincheiras,
estratégias e a terra de ninguém: o desenrolar do
conflito.
Disputando cada milímetro
de espaço como se fosse o último, os soldados pereciam
nas covas que chamavam de trincheiras, enquanto a glória
que desejavam se desmanchava com o suor das batalhas.
Prof. Pablo Michel
Magalhães
DAS
CARTAS QUE ESCREVI...
É triste
ficar longe de quem gostamos. Saudade, tristeza, medo de
que o pior aconteça. Sonhamos à noite com o regresso de
quem se foi, e contamos os dias para que possamos rever
nossos entes queridos. Todos esses sentimentos estiveram
presentes nas várias cartas que famílias e soldados
trocavam, enquanto bombas, tiros e gases venenosos
destruíam a saúde e a vida de muitos no campo de
batalha.
Quando a
glória e as esperanças heróicas de uma guerra curta se
foram, sobraram soldados cansados e abatidos, que ainda
tinham a ordem de destruir o inimigo, homens que sequer
conheciam. Quando a guerra atingiu sua fase de
entrincheiramento, o tempo parecia ser o que menos
importava: dias, meses, anos... O importante era ganhar
terreno, ocupar os espaços do inimigo, vencê-lo pelo
cansaço.
Em geral,
dividimos a primeira Grande Guerra em duas partes:
- 1ª fase -
Guerra de Movimento (1914);
- 2ª fase -
Guerra de Posição e Batalhas Finais (1915 - 1918).
Na primeira
fase, a Guerra de Movimento, muitos historiadores
lembram-se apenas do lado francês da batalha. Porém,
aqui, vamos falar sobre as duas Frentes (ocidental e
oriental), para explicar como essa primeira parte se
desenrolou, até fins de 1914, com a corrida para o mar.
Quem
inaugura a movimentação é a Alemanha, utilizando-se da
ideia de ataque rápido, massivo e efetivo sobre a
França. Através do Plano Schlieffen, os alemães
atacariam e ocupariam o país dos franceses em até seis
semanas, deixando, do lado oriental, forças em formação
defensiva. A ideia era neutralizar os exércitos
franceses, para que, isoladas, Inglaterra e Rússia não
conseguissem opor resistência aos alemães.
O plano
ainda previa que o ataque à França começaria pelo
combate rápido contra as tropas da Bélgica, Holanda e
Luxemburgo (países menores e com uma força militar
relativamente menor).
Porém, essa
estratégia mostrou-se inútil, uma vez que, ao ocupar a
Bélgica, os alemães tiveram muito mais trabalho do que
imaginavam, pois o exército do rei Alberto I, sob sua
liderança, superou às expectativas e resistiu bravamente
às investidas. Vendo seus planos serem retardados, o
comandante Moltke ordenou bombardeamentos nas cidades
com artilharia pesada e fuzilamento de reféns (numerosos
civis foram mortos). Com isso, os alemães tomaram o controle do
país dos belgas e marcharam pelo norte até Paris.
Ao sul, o
segundo exército alemão foi recepcionado por tropas
francesas, que haviam marchado em direção à Sarresburgo,
atravessando a fronteira com a Alemanha, travando a
Batalha das Fronteiras, péssima para a França. Ao norte,
o general Von Kluck marchava sobre solo francês com
soldados já exaustos, tendo como objetivo principal
tomar Paris. Com o perigo girando em torno, o presidente
Poincaré e sua cúpula administrativa fugiram para
Bordéus.
Talvez por
achar que já estavam ganhos e que Paris não
representaria qualquer empecilho, e acreditando, também,
que as forças britânicas, que vieram em socorro aos
franceses, não apresentariam maior resistência, Von
Kluck resolveu mudar seu curso, e dirigiu-se para o Rio
Marne. Avisados por um piloto de avião, que fazia um voo
de reconhecimento da área, franceses e ingleses partiram
para o ataque, surpreendendo o general Von Kluck e o
comandante Moltke. Desbaratados, tiveram de abandonar o
plano e buscar refúgio no corte do rio Aisne. O "milagre
do Marne" pôs fim ao plano Schlieffen, acabou com as
possibilidades de uma guerra curta, e promoveu o
primeiro recuo alemão no conflito.
Na Frente
Oriental, os generais Von Rennekampf e Samsonov, do
exército Czarista, fizeram frente ao alemão Prittwitz e
seu VIII Exército. Com uma rápida mobilização, os russos
surpreenderam as divisões alemãs, que se viram obrigadas
a recuar. Nesse contexto, o general Prittwitz foi
substituído por Ludendorff e Hindenburg, generais que
mostraram maior astúcia e dinamismo, assessorados pelo
coronel Hoffmann, outro militar hábil.
A reunião
destes líderes determinou, ao lado de uma tropa mais
preparada, o triunfo alemão frente os russos. Além
disso, os alemães demonstraram astúcia ao interceptar as
mensagens transmitidas pelos soldados da Rússia
czarista, que enviavam suas comunicações sem codificá-las,
facilitando o trabalho.
Soldados russos aprisionados, após a batalha de
Tannenberg.
Nas batalhas
de Tannenberg e Lagos Masurianos, os russos foram
massacrados, com perdas que superaram 300 mil homens em
campanha.
Em 1915,
após a ofensiva franco-britânica em Artois, que se
revelou fracassada, teve início a fase da Guerra de
Posição, que se estenderá até a vitória dos aliados,
em 1918, na Batalha de Amiens.
A partir
desse momento, com a chegada do Inverno, trincheiras são
escavadas para servir de proteção no período de frio. A
ideia inicial era de que, tão logo passasse a estação,
com suas nevascas e péssimas condições de batalha, as
ações táticas de guerra fossem retomadas. Ledo engano:
as trincheiras seriam, daí em diante, o local principal
dos combates.
Com o tempo,
os soldados foram aumentando a proteção em torno das
suas trincheiras. Arames farpados, sacos de areia,
proteções contra bombardeios: tudo o que fosse possível
para potencializar o abrigo e a sobrevida. Fora destas
"covas", o terreno que separava os inimigos e suas
trincheiras passou a ser chamado "terra de ninguém", a
zona de morte, onde os tiros de canhão e as balas dos
fuzis rasgavam o ar. Era através dela que corriam os
soldados, no momento do ataque, para ocupar a trincheira
dos adversários, escapando dos perigos com faca nos
dentes e muita coragem (ou medo, por que não?),
carregando suas baionetas e o que mais houvesse que
pudesse ferir ou matar o inimigo. Também na "terra de
ninguém" faziam-se incursões de observação e de resgate
de soldados feridos.
É nessa fase
da guerra que batalhas importantes (e fracassadas), como
a de Galipoli, pela posse do Estreito de Dardanelos
iniciada pelos Aliados contra o Império Otomano, e a de
Verdun, onde os alemães procuraram massacrar os
franceses, acontecem. Na primeira, os turcos triunfaram,
apesar das pesadas baixas, de ambos os lados,
decorrentes de uma campanha militar das mais
sanguinárias e violentas da Grande Guerra; na segunda, o
general Pétain liderou os franceses na vitória sobre os
alemães, com uma cifra assustadora de granadas lançadas:
43 milhões, mais de 200 mil por dia de batalha.
Em novembro
de 1917, a Revolução Russa triunfa nas terras do Czar, e
Lênin assina um acordo de paz com a Alemanha e as
Potências Centrais. Esse fator alivia e muito a situação
alemã, que se volta completamente para a Frente
Ocidental, para enfrentar franceses e britânicos.
Com um
Império Otomano totalmente enfraquecido (a Revolta
Árabe, de 1916, havia transformado o território imperial
em um campo de guerra mais perigoso que a própria Grande
Guerra, contra britânicos e russos), e uma Áustria que
mostrava-se efetiva no campo de combate (suas ações
táticas contra os italianos foram tão vitoriosas que os
exércitos inimigos sequer conseguiram atravessar os
Alpes e adentrar no país, e ainda capturaram 300 mil
soldados italianos!), mas que dependia, e muito, dos
estrategistas alemães, a Alemanha via cada vez mais
urgente a necessidade de derrotar rapidamente franceses
e britânicos.
Outro perigo
para os alemães era a chegada dos americanos. Com tropas
novas, material novo, recursos até então considerados
infinitos e armas prontas para o combate, os Estados
Unidos figuravam no palco da Primeira Guerra Mundial
como um reforço poderoso para os Aliados, e um inimigo
feroz para a Alemanha e as Potências Centrais.
MOMENTOS
FINAIS DE UMA GUERRA EXAUSTIVA
Em 1917, a
Terceira Batalha de Ypres e a Batalha de Amiens
praticamente definiram os rumos da Grande Guerra. Em
sequências exaustivas de combates, as cifras das mortes
eram gigantescas.
Em Ypres,
apesar da vontade dos generais Foch e Haig em dar um
ponto final com uma contra-ofensiva, após perder espaço
para os Aliados (que contavam com 1.200 aviões e 500
tanques de guerra), nenhuma tática consegue findar os
combates, que continuam sem esperanças de acabar.
Em Amiens,
os Aliados conseguem romper a frente alemã, deixando os
exércitos alemães vulneráveis. Esse êxito, ocorrido no
dia 8 de agosto de 1918, ficou conhecido como o "dia
negro" para os alemães, porque estes foram massacrados
em batalha pelas tropas Aliadas.
Logo,
uma sucessão de acontecimentos vão, pouco a pouco,
desestabilizando a continuidade da Grande Guerra: em
setembro e outubro de 1918, Bulgária e o Império
Turco-Otomano capitulam, exaustos; a Áustria, mal das
pernas, havia tentado a paz com a França em 1917, sem
sucesso, e no ano seguinte, através de um telegrama,
anunciou ao imperador Guilherme II sua retirada da
aliança (pouco tempo depois, o Império Austro-Húngaro
seria totalmente dissolvido, através dos tratados de
Saint-Germain e Trianon).
Dia da assinatura do Armistício de Compiègne.
À Alemanha
restou a rendição através do armistício de Compiègne,
assinado em 11 de novembro de 1918, que infligia ao país: 1) Reduzir suas tropas pela metade; 2) Pagar
indenizações e multas vultosas aos vitoriosos; 3) Ceder
suas colônias na África e restituir a Alsácia-Lorena à
França. Em 1919, o Tratado de paz de Versalhes firmaria
definitivamente o fim da Primeira Guerra Mundial,
impondo uma série de medidas que colocavam a Alemanha em
uma situação crítica e insustentável, com o claro
interesse de impor a este país a miséria de sua
população, contribuindo para um clima de instabilidade
social e política que culminaria com a ascensão de
Hitler e do Nazismo em 1933.
REVISANDO... (JUNTAR OS CACOS, EUROPA! JUNTAR OS
CACOS...)
Muito além
do armistício e da entrega alemã nos 45 do segundo
tempo, a Grande Guerra de 1914-1918 deixou para trás
nações destruídas, cidades fantasmas, pessoas
desiludidas, fome, miséria, pobreza. O fim da guerra
representou mais a exaustão dos países envolvidos do
que, propriamente, a vitória dos Aliados sobre as
Potências Centrais. Para alguns historiadores, em
especial o saudoso Eric J. Hobsbawm, o que houve foi uma
pausa, para que o conflito se concluísse entre 1939 e
1945, na Segunda Guerra Mundial. Ou seja, desde 1914,
passando por um período de reorganização entre 1919 e
1938, até 1945, o mundo viveu uma longa, mortal,
exaustiva e angustiante Grande Guerra.
Não acompanhou a nossa série desde o início? Recomece a
leitura clicando abaixo:
Texto 1 - A
glória esperada de uma guerra rápida e a ponta do
iceberg em Sarajevo.
(Texto do Prof. Pablo
Michel Magalhães, da redação d'O Historiante). |
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