24/08/2013
A Guerra de Secessão americana
colaborou para o enriquecimento do Ceará.
Prof.
Neto Almeida
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O mundo industrial-capitalista no século XIX já não
ficava mais restrito apenas ao espaço da Inglaterra. A
segunda Revolução Industrial introduzia outros países
europeus, como a França, Bélgica e, tardiamente, a Itália e
Alemanha, assim como os EUA, dando início na Era
Contemporânea à Divisão Internacional do Trabalho. Por outro
lado, no mesmo período, a Província do Ceará começava a
se organizar enquanto uma rede política e econômica, que,
na segunda metade do século XIX, se consolidaria no
entorno de Fortaleza. Ora, qual a relação do processo
industrial na Europa e nos EUA com a centralização
econômica e política de Fortaleza, consolidando sua
hegemonia dentro do Ceará diante das demais vilas?
Os Estados Unidos ampliaram suas relações internacionais
nitidamente após o processo de Independência de suas
treze colônias, no final do século XVIII, passando cada
vez mais a fornecer produto de matéria prima para a
indústria inglesa. Na Inglaterra, a produção têxtil
alcançava números cada vez maiores. E no Ceará várias
vilas disputavam a hegemonia dentro da Província. As
várias ribeiras do Ceará, que tinham sido ocupadas
principalmente pela introdução das fazendas de gado
(pecuária) a partir dos caminhos de dentro (sertão) e
caminhos de fora (litoral) destacavam uma
descentralizada política e econômica. Muito colaborou
para essa heterogeneidade do espaço cearense a
dependência que teve essa região com Pernambuco até o
ano de 1799.
Na segunda metade do século XIX, a Guerra de Secessão
Americana (1860-1865) ocupou quase que todos os esforços
da sociedade civil americana no combate de guerra,
diminuindo drasticamente suas exportações para a Europa,
abrindo a necessidade de um novo pólo produtor e
exportador da matéria-prima advinda da cotonicultura.
A maior parcela da população cearense estava distribuída
nas fazendas de gado espalhadas pelas margens dos rios,
principalmente o Rio Jaguaribe, e foram estas atividades
pecuaristas que favoreceram o processo de independência
de Pernambuco. Mas o desenvolvimento do charque no sul
do Brasil, principalmente pela formação dos estancieiros
gaúchos, concorreu para um enfraquecimento na venda da
carne de charque do Ceará para abastecer as outras
regiões, principalmente o litoral nordestino e a área
correspondente às Minas Gerais e a capital (Rio de
Janeiro), que tinham maior adensamento populacional. O
Rio Grande do Sul despontava como grande exportador
pecuarista por diversos fatores, dentre estes estavam a
regularidade das quadras invernosas, maiores rebanhos,
maior qualidade da carne, proximidade com os centros
compradores do produto; enfraquecendo a economia do
Ceará, que buscou novas fontes de lucro.
A província do Ceará não tinha sido, nem nos tempos
coloniais, nem no período do Império, uma região de grandes
concentrações de mão de obra do negro cativo trazido da
África, tanto é que promoveu a abolição quatro anos
antes do restante do Brasil (1884 – em Acarápe, hoje
município de Redenção/CE), tanto pela atividade que
desenvolveu de criação de gado como pela ausência de uma
economia açucareira como em Pernambuco e Bahia, com
exceção do Sul do Ceará, a região do Cariri (Crato,
Juazeiro e Barbalha) que mantiveram laços muito próximos
à Pernambuco e desenvolveram pequenas oficinas de
produção de açúcar, contudo o restante daquilo que seria
considerado o atual Estado do Ceará se formou com
baixíssimo uso da mão de obra cativa.
A atividade de produção do algodão surgia assim como um
produto precioso para essa economia que via, cada vez
mais, suas exportações diminuírem por conta da
concorrência e um mercado mundial que comprava cada vez
mais o “ouro branco” do século XIX. Foi com a diminuição
da exportação americana por conta da guerra civil lá,
que a Inglaterra começou a procurar novas fontes para
comprar e encontrava o Ceará desenvolvendo um incipiente
mercado na área.
O algodão reunia, enquanto atividade, uma série de
elementos que favoreciam o Ceará como plantador e
exportador desse produto: não precisava de uma
regularidade de chuvas (importante pensar essa
característica por que o Ceará sempre foi marcado por
severas secas e irregulares períodos chuvosos), o algodão
podia ser plantado e colhido em curto período de tempo,
não demandando outras atividades completares para quem
iniciava seu plantio, era fácil de ser plantado e
colhido, colaborando para um pequeno investimento na mão
de obra, perfeito para um momento de crise e tinha um
mercado consumidor certo, além de necessitar de poucos
trabalhadores.
O Ceará passava assim a produzir algodão e exportar essa
matéria-prima para a Inglaterra, se inserido de vez na
divisão internacional do trabalho, abrindo portas para
entrada do capital inglês e atraindo diversos
investimentos ingleses privados e estrangeiros. Para
esse escoamento da produção, os caminhos que fazia esse
algodão eram bem distintos ao antigo processo de
distribuição da carne de charque, que obedecia ao curso
dos rios; para enviar o algodão para a Inglaterra, o
porto de Fortaleza era a principal porta de saída,
atraindo para a cidade todo o volume capital daquele
momento. Fortaleza se consolidava economicamente,
deixando para trás antigas vilas, como a do Aracati, que
foi o principal ponto da charqueada. Ao mesmo tempo em
que abria as portas para escoar seu produto, era também
ponto de entrada de diversas alterações, desde a
necessidade de construir uma cidade organizada, por que
não era pensada até aquele momento essa organização
urbana, passando pelos costumes e cultura, que passaram a
se identificar com aquilo que estava em moda no restante
da Europa.
Uma pequena parcela da população, que enriquecia com a
venda do algodão, moldava agora seus costumes de acordo
com a moda de Paris. Nascia nos anos 1860 e se estenderia
pelos anos 1870 a Fortaleza Belle Epóque. No mesmo período,
o Presidente da Província contrata o engenheiro Adolfo Herbster para organizar o espaço urbano da cidade de
Fortaleza, agora centro hegemônico da Província. O
traçado criado e arregimentado para a época seguia as
determinações do urbanismo internacional com uma divisão
da malha urbana em xadrez e cortes ortogonais, criando
uma rede de fácil controle e eliminando o crescimento
espontâneo da cidade, além disso, afastando para a
região do areal a população de menor poder econômico –
outras plantas seguiram o trabalha do engenheiro citado
acima, como as plantas de 1875, 1888, mas já em outro
contexto .
Durante a década de 1860, o Ceará se tornava o maior
exportador do Brasil, superando os números de exportação
do café que até aquele momento era o produto principal
na política econômica imperial do Brasil e no Ceará
ficou em segundo lugar na pauta de exportação. (Veja a
tabela abaixo)
Ano |
Algodão |
Café |
1865 |
2.002.114 |
1.092.344 |
1866 |
2.380.838 |
778.604 |
1867 |
4.332.412 |
1.812.687 |
1868 |
4.686.300 |
50.800 |
1869 |
5.219.147 |
877.523 |
1870 |
7.253.983 |
560.283 |
Fonte: Guabiraba (1989).
A substituição da pecuária pela atividade agrícola não
aconteceu de uma forma que rompeu a primeira e foi
substituída como consequência pela segunda, mas foi ao
longo de um processo conjuntural que favoreceu essa
inversão na pauta econômica provincial.
A população que lucrava com o algodão, pequena parcela,
vestia agora a moda da França, ou especificamente –
Paris. Tinha o mesmo traçado urbano que a cidade de Haussaman, e lia os livros que a sociedade parisiense
estava recomendando. A percepção da influência europeia
para além da compra e venda do produto algodão nos leva
a analisar algumas das reproduções que a pequena elite
fortalezense fazia: o uso de roupas longas, com várias
saias, anáguas, espartilhos, luvas e ‘chapeós’ por parte
das mulheres era uma efervescência do período, os homens
de igual modo trajavam seus ternos limpos e bem
passados, com gravatas alinhadas e flor na lapela.
Abaixo, observem fotografia de uma família no Passeio Público,
símbolo da época de espaço de lazer e sociabilidade.
Era entendido como a mais pura representação de
civilidade, inovador pelo termo Belle Epoqué, que
inundaria outras capitais do Brasil, trazendo consigo o
ideal de desenvolvimento para a sociedade. Contudo, o que
sabemos é que essa Fortaleza afrancesada era privilégio
de poucos: além dos custos serem altos, a maior parte da
população era paupérrima e vivia à míngua, não
demonstrando qualquer ligação estreita com a cultura europeia.
Diversos equipamentos foram incorporados aos usos da
população da cidade como a introdução dos bondes,
principal meio de deslocamento, primeiros puxados por
burros, anos mais tarde que foram introduzidos os bondes
elétricos, e mais outros equipamentos como telégrafos,
telefones, praças, boulevard – como símbolos do
desenvolvimento e espaço de sociabilidade.
A seca no final da década de 1870 colocaria freios nessa
expansão do capital econômico da cidade, a pior seca que
a elite fortalezense registrou na sua história envolveu
os anos de 1877-1879, chegou às ruas da capital com
milhares de famintos e mendigos que assombrava os
moradores. A Fortaleza parisiense encarava seu mais
temido pavor – a pobreza – dos milhares de retirantes do
sertão que se dirigiam a capital para serem empregados
nas construções de obras públicas ou para tentar escapar
da fome. Após o início da década de 80 a economia
americana deu sinais de recuperação também, voltando os
ingleses a comprar o algodão de um polo produtor mais
próximo e com isso mais barato, permanecendo o algodão
cearense como principal produto da pauta da economia
local, mas agora com menor volume de recursos
arrecadados.
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Você sabia que um bode já virou vereador no Ceará?
Bode Ioio
Quem olha hoje as eleições no Brasil e ri quando
mulher-fruta ou um palhaço qualquer são eleitos para um
cargo público, acharia normal se conhecesse a história
do famoso bode Ioio de Fortaleza – Ceará.
Você já ouviu falar do famoso bode que ganhou o coração
e carinho dos fortalezenses na década de 1920? Foi eleito
por muitos como mais um vadio da Praça do Ferreira, pois
vivia junto daqueles que bebiam e jogavam nos banquinhos
da praça, que é considerada o coração da cidade. História
sobre o bode não faltam, e tudo que acontecia de mais
irreverente era atribuído ao famoso animal.
Primeiro, o caso das saias das mulheres, que passavam
desfilando e faceiras pelas ruas e praças. Era nesse
momento que o bode aproveitava e levantava a barra das
saias de suas donas, causando o riso e o delírio da plateia que se juntava para ver as ‘malandragens’ do
caprino.
Escapou de morrer quando seu dono ficou entre colocá-lo
na panela ou arrecadar algumas moedas com ele. Foi
quando o animal foi comprado por um representante da empresa
britânica no nordeste – Rossbach Brazil Company –, que
resolveu torná-lo mascote da empresa.
Contudo, foi na inauguração do Cine Moderno, quando se
amontoava numerosa plateia à espera do Intendente
Municipal Godofredo Maciel e o Presidente da Província
Justiniano de Serpa para cortar a faixa e inaugurar o
mais novo espaço de lazer na cidade, que o bode aprontou
seu maior ato, comendo a faixa antes do corte da mesma
pelas autoridades da cidade, considerando inaugurado o
novo cinema. Lógico, levou o público ao delírio, que logo
lançou sua candidatura a vereador da cidade.
Nas eleições seguintes, para a surpresa de todos, no
momento da contagem das cédulas, choveram papeis que
continham o nome do bom e velho malandro da Praça do
Ferreira: Bode Ioio, eleito vereador da cidade de
Fortaleza. Ganhou, mas não assumiu, não realizou nada,
mas também não prometeu!
Tempos depois, o bode Ioio apareceu morto na Praça que
mais gostava de frequentar. Alguns dizem que foi
atentado político, outros falam que fora algum noivo
furioso com mais uma levantada de saia na mulher errada.
Adolfo Caminho, sensibilizado com o corpo do bode Ioio,
mandou empalhar o bode e colocou exposto no Museu do
Ceará, onde vocês podem visitar e conferir essa peça rara.
Pois é, no Ceará é assim.
A eleição de um bode pós-graduado em vadiagem.
(Texto do
Prof. Neto Almeida, da redação d'O Historiante)
(Clique aqui e confira os
textos deste autor)
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